domingo, 1 de março de 2015

Freud e a psicologia científica

a crítica é explicita, embora, de fato, a fundamentação no texto seja confusa e pouco precisa. Ele acusa Freud de ter se desviado de um projeto científico para a psicologia clínica, e ele está correto (no essencial), se for adotada a interpretação e metodologia modernas de ciência.

A ideia original de um projeto para a "psicologia científica" remonta ao Iluminismo Kantiano, sendo Freud inicialmente apenas mais um dos herdeiros dessa tradição. É minha opinião que Freud nunca tenha abandonado por completo essa influência ou tendência Iluminista (veja por exemplo o texto "a questão de uma weltanschauun", de 1933), mas quando em 1895 ele abandona o "projeto para uma psicologia científica", sua obra toma um novo direcionamento. (é isso que o autor lamenta quando usa a expressão "oportunidade perdida").

O ponto aqui é que, como definiu o historiador, epistemólogo e filósofo da ciência Thomas Kuhn, o paradigma científico da modernidade se fundamentou no materialismo newtoniano (baseado numa ideia de ordem fixa e absoluta da realidade da matéria) e no sucesso das "ciências naturais", se constituindo portanto como "uma forma objetiva de investigação de caráter sistemático, lógico, empírico redutivo e replicável em pesquisas". Se aplicássemos esses filtros às descobertas da primeira e segunda tópica freudianas o que sobreviveria? Claro que nada!, pois a metapsicologia freudiana é toda especulação que se não pode ser refutada também não pode ser provada; as hipóteses da transferência, resistência, recalque, complexo de édipo, narcisismo, pulsão e (mais importante) inconsciente não podem ser reproduzidas sob condições controladas em experiências de laboratório, e não podem portanto fornecer explicações universais para o comportamento humano. Esse é o "fetiche" atual da neurociências, e não da psicanálise - que aqui rompe com o racionalismo Iluminista para incorporar os elementos justamente contrários do Romantismo Alemão. 

O preço final disso tudo é que o inconsciente freudiano se torna tão oculto e místico quanto o espírito santo, e contar apenas com o relato do psicanalista ou a fé subjetiva do paciente e dos iniciados no tratamento para validar as hipóteses psicanalíticas como científicas é obviamente insuficiente (e até risível). Ou seja, para a concepção instrumental da ciência moderna, o discurso de um analista que fala a partir da sua própria experiência de análise pessoal tem a mesma autoridade que a leitura do futuro feita por uma cartomante... 

A partir disso, penso eu que o registro mais adequado para compreender o campo de saber e conhecimento promovidos pela psicanálise ainda seria o poético, e não o científico (pelo menos não sob o paradigma do cientificismo moderno). Esse é o motivo pelo qual para o autor deste texto ou qualquer outro cognitivista experimental (herdeiro das verificações lógicas por análises puramente quantitativas), "a psicanálise tropeça quando tenta afirmar algo de universal e testável sobre a psicologia humana". Muito provavelmente nem passa pela cabeça deles que, talvez, o problema esteja mais na limitação do método científico de formulação e resolução dos problemas do que no que a psicanálise tem a dizer sobre a experiência humana. Eu sei que eu jamais entraria em discussão com qualquer um destes para defender se freud foi ou não um "cientista", pois considero o atributo de "cientista" pequeno demais para Freud, que a meu ver foi um verdadeiro gênio, e gênios nem sequer precisam de advogados de defesa. rs!

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